quinta-feira, 18 de outubro de 2007

Anti-herói, anti-vilão

Se for parar pra pensar, toda a polêmica que o Tropa de Elite vem causando se deve quase que somente ao seu personagem principal. Nem a violência ou a corrupção policial, nem a hipocrisia da classe média e nem a questão da favela e das drogas; apesar de tocar em todos esses assuntos (e mais uns outros), o centro do filme é mesmo o Capitão Nascimento.

Talvez o que cause essa polêmica seja o fato desse personagem apresentar características que oscilam entre os de um anti-herói e de um anti-vilão -- o que é, ao meu ver, um dos pontos positivos do filme -- tornando-o muito mais complexo e, conseqüentemente, humano. Mas aparentemente isso confundiu uma porção do público que imaginou que aquilo seria um filme de tiroteio estereotipado, cujo protagonista não poderia ser outra coisa que não um herói.

O cara é um pouco anti-herói porque usa alguns meios considerados "imorais" para fazer (o que do ponto de vista dele é) o bem. Ou seja, tudo bem torturar e matar se for para combater o crime, manter a ordem ou garantir o sono do papa. Mas esses mesmos motivos também o tornam um pouco anti-vilão: ele tortura e mata em nome da lei, mas é um pai de família que sente ternura pelo filho, tem crises de consciência etc.

Pra complicar mais ainda, o personagem consegue ser muito carismático. Quem não riu quando ele disse todas aquelas coisas que em teoria não são tão engraçadas? Aí, juntando esse carisma à complexidade, temos um protagonista que é tão f...dido e mal-pago quanto qualquer pessoa real, normal e legal.

No fundo essa história de anti-herói/anti-vilão acaba sendo tão maniqueísta quanto a do herói/vilão. No fundo o personagem oscila entre os diferentes papéis de acordo com a situação e o ponto de vista, assim como aconteceria com uma pessoa comum. O que obviamente suscita o ódio em uns, enquanto todos os outros adoram. E, como disse a , quem diz que odeia na verdade deve ter adorado...

Personagens planas e redondas
Todo mundo viu na escola, mas dessa vez vale a pena ver de novo. A personagem redonda é psicologicamente densa e pode sofrer alterações com o desenrolar da trama. Já a personagem plana permanece inalterada durante o seu percurso, sendo muitas vezes estereotipada. E é psicologicamente broxante.

A complexidade dos personagens varia de acordo com a importância do seu papel na história, de modo que o protagonista em geral é o mais complexo. Seguindo uma lógica de hierarquia, os secundários são menos complexos, mas não chegam a ser rasos. Isto é, podem até mudar muito -- como o bad-ass motherfucker de que a Dora falou --, mas não são assim tão densos ou complicados. Aí tem aqueles que são os menos complexos de todos; são tão simples (ou simplificados) que podem ser chamados de "a ralé da trama".

Enfim, isso foi só pra dizer que é muito deprimente notar que, no filme, os personagens mais planos não são nem os traficantes, nem os policiais corruptos. São os universitários mesmo. E isso é um tanto mais deprimente quando se constata a verossimilhança entre a personagem e o tipo retratado. Quer sair por aí dizendo de peito cheio que tem consciência social, é? Ahh, traz o saco, 06!